Em 2024, as doações para Organizações da Sociedade Civil (OSCs) no país cresceram 40%, totalizando R$ 23,6 bilhões. O valor médio doado por pessoa também aumentou, passando de R$ 260 para R$ 300 ao ano. Esse aumento é notável, especialmente em função das enchentes que atingiram o Rio Grande do Sul entre abril e maio de 2024, impactando 478 dos 497 municípios do estado.
Esses dados fazem parte da segunda edição da pesquisa “Retrato da Solidariedade – Comportamento Pró-Social no Brasil”, realizada pela Fundação José Luiz Setúbal. Esta fundação, criada em homenagem ao pediatra e fundador do Hospital Infantil Sabará, em São Paulo, também é vinculada a um dos herdeiros do banco Itaú.
O número de doadores cresceu 18% em 2024. No entanto, esse aumento não foi visto entre os mais ricos. Nas famílias com renda superior a 20 salários mínimos, a proporção de pessoas que declararam ter doado caiu de 42% para 36%. Além disso, o valor médio das doações desse grupo diminuiu de R$ 1.000 para R$ 800. Na faixa de renda entre 10 e 20 salários mínimos, o cenário se manteve estável.
A pesquisa dividiu os dados em seis faixas de renda, e as camadas mais baixas mostraram um aumento nas doações, especialmente na faixa entre dois e quatro salários mínimos. Neste grupo, 37% dos entrevistados disseram ter contribuído, o que representa um aumento de nove pontos percentuais em relação a 2023.
No entanto, o estudo revelou uma queda na busca ativa por doações entre os que ganham mais de sete salários mínimos. Em 2023, 54% dessas pessoas relataram ter recebido pedidos de doação, enquanto em 2024 esse número caiu para 46%. Isso sugere uma possível mudança na estratégia das OSCs ou desafios em contatar donatários de renda mais alta.
O pesquisador Flávio Pinheiro, responsável pela análise, observou uma redução nas doações regulares, que costumam vir de pessoas com maior renda. Ele atribui isso a fatores econômicos gerais e à transição do modelo de pagamento, que agora é mais utilizado por meio de Pix, em vez de débitos automáticos via cartão.
A pesquisa também revelou um dado interessante: as pessoas com renda familiar de até quatro salários mínimos são as que mais contribuem, proporcionalmente, no país. Ao todo, foram entrevistadas cerca de 2,6 mil pessoas, incluindo 566 de renda elevada, possibilitando um panorama mais preciso sobre esse grupo.
Embora o volume total de doações tenha aumentado, a pesquisa indica que a cultura de doação ainda é fraca, e muitos brasileiros tendem a doar em resposta a tragédias. A mobilização solidária registrada durante as enchentes do Sul exemplifica a capacidade de empatia da população, mas a pesquisa questiona como transformar essas ações momentâneas em apoio duradouro a causas sociais.
Entre as pessoas que contribuíram, 83% relatou ter decidido doar de forma espontânea e sem planejamento. Já a proporção de doadores regulares caiu de 11% para 8% em comparação ao ano anterior.
As doações feitas por meio do Imposto de Renda também aumentaram, subindo de R$ 281,7 milhões para R$ 414 milhões entre 2023 e 2024. A Receita Federal sugere que esse crescimento pode ser atribuído a doadores que destinam pequenas quantias, refletindo a inclusão de pessoas de menor renda no cerne dos doadores.
Um em cada quatro adultos, ou 27% da população, prestou algum tipo de ajuda às vítimas das enchentes no Rio Grande do Sul, seja por meio de doações financeiras ou atuando como voluntário.
As maiores contribuições vieram das regiões Sul e Sudeste, que estão mais próximas das áreas afetadas pelas enchentes. No Sul, 40% dos moradores fizeram ao menos uma doação às OSCs em 2024. O Norte, também impactado por uma seca severa, viu um aumento significativo no número de doadores, enquanto o Centro-Oeste se manteve estável. O Nordeste, por outro lado, registrou uma diminuição no número de contribuintes.
A pesquisa ainda destacou que cerca de um terço dos homens e mulheres entrevistados fez doações, com um aumento maior entre os doadores masculinos, que cresceu sete pontos percentuais, em comparação a quatro pontos percentuais entre as mulheres.
As causas mais apoiadas pelos doadores foram: combate à fome (30%), assistência social (25%), saúde (21%), proteção aos animais (14%), educação e pesquisa (12%), proteção ao meio ambiente (8%) e arte e cultura (4%). As áreas de educação, meio ambiente e cultura receberam menos atenção, revelando que a solidariedade ainda está ligada, em grande parte, a necessidades básicas.